Nos últimos anos, o papel do farmacêutico no Brasil tem se ampliado significativamente, com destaque para a prática clínica e a atuação em consultórios farmacêuticos. As farmácias comunitárias, que somam mais de 94 mil estabelecimentos, representam o ponto de saúde mais acessível à população, com o farmacêutico como o profissional de saúde mais próximo para orientar e cuidar dos pacientes. Elas estão distribuídas em cerca de 99% dos municípios brasileiros, e estima-se que grande parte das famílias brasileiras passe ao menos 2x por mês na farmácia, enquanto passe 2x ano no médico, o que destaca a grande capilaridade e acessibilidade desse estabelecimento de saúde.
Esse impacto reflete-se em números expressivos: apenas no primeiro semestre de 2024, mais de 7,3 milhões de serviços de saúde foram realizados por farmácias e consultórios farmacêuticos em mais de 1.150 municípios brasileiros.
Além disso, mais de 500 mil exames de dengue foram realizados no mesmo período, respondendo de forma decisiva a emergências em saúde pública, e 389 mil prescrições farmacêuticas foram emitidas em 2023 — um crescimento de 500% em relação ao ano anterior. Destas, 54% estavam relacionadas a medicamentos e produtos, 28,2% a medidas não farmacológicas e 17,7% a formulações magistrais.
A Resolução CFF 586/2013 é um marco nessa evolução, regulamentando a prescrição farmacêutica e definindo limites e responsabilidades. Ela estabelece que os farmacêuticos podem prescrever medicamentos isentos de prescrição médica e, em casos específicos, medicamentos sujeitos a prescrição, desde que haja diagnóstico prévio ou quando o mesmo não seja um requisito (como no caso das vacinas, pois se tratam de medicamentos que previnem doenças e problemas de saúde, ou dos contraceptivos hormonais para prevenção de gravidezes indesejadas) e que a prescrição esteja alinhada a protocolos, programas de saúde ou acordos de colaboração com outros profissionais ou instituições de saúde.
Benefícios e desafios da prescrição farmacêutica no Brasil
A prescrição farmacêutica traz segurança ao paciente, reduzindo riscos associados à automedicação, que afeta 90% da população brasileira. Durante a pandemia de COVID-19, farmácias se consolidaram como centros de saúde ao realizar mais de 21 milhões de exames de diagnóstico. Essa capacidade, aliada à expertise técnica dos farmacêuticos em mais de 140 áreas de atuação, fortalece o sistema de saúde, ao mesmo tempo que desafia as barreiras corporativistas e jurídicas enfrentadas por esses profissionais.
Modelos internacionais de prescrição farmacêutica
A prática de prescrição farmacêutica é consolidada em diversos países, com modelos que refletem o potencial transformador dessa atuação. Abaixo, destacamos exemplos e dados de impacto:
– Estados Unidos: Em todos os 50 estados, farmacêuticos podem prescrever medicamentos para condições específicas, como contraceptivos, cessação do tabagismo, vacinas e profilaxias de HIV. Programas estaduais também permitem prescrição independente para doenças crônicas, como diabetes e hipertensão, com impacto significativo na prevenção de complicações e redução de hospitalizações.
– Canadá: A província de Alberta lidera a autonomia farmacêutica desde 2007, permitindo que farmacêuticos prescrevam de forma independente, ajustem tratamentos e solicitem exames laboratoriais. Estudos mostram que 85% dos pacientes atendidos relataram maior confiança no farmacêutico, e houve uma economia de até 30% nos custos associados a tratamentos crônicos.
– Reino Unido: No National Health Service (NHS), farmacêuticos prescrevem dentro de protocolos para doenças como asma, artrite reumatoide e infecções. A prescrição integrada reduziu em 15% as internações relacionadas a falhas terapêuticas e gerou uma economia anual de £500 milhões.
– Austrália: Programas-piloto em estados como Queensland e Nova Gales do Sul já permitem que farmacêuticos prescrevam medicamentos para infecções comuns e condições crônicas leves. No Queensland Pharmacy Scope Trial, mais de 60% dos pacientes que utilizaram o serviço relataram maior satisfação do que com o sistema tradicional.
– Nova Zelândia: Desde 2013, farmacêuticos podem prescrever medicamentos para diabetes, hipertensão e outras condições. Um estudo mostrou que 72% dos pacientes preferem farmacêuticos pela acessibilidade e conveniência, enquanto o sistema de saúde economizou milhões de dólares ao evitar complicações graves.
– Portugal: Farmacêuticos prescrevem medicamentos para doenças crônicas em conformidade com protocolos integrados, atuando como elo fundamental entre médicos e pacientes, principalmente em áreas rurais.
– Espanha: A prática clínica dos farmacêuticos inclui prescrição para condições menores e ajuste de doses para pacientes em programas de atenção primária.
– Irlanda: Farmacêuticos podem prescrever vacinas, contraceptivos e tratamentos de emergência. Programas de vacinação por farmacêuticos aumentaram em 25% a cobertura vacinal no país.
– África do Sul: Embora o modelo tenha sido reduzido nos últimos anos, farmacêuticos ainda podem prescrever medicamentos para HIV e tuberculose em áreas remotas, garantindo acesso essencial.
– França e Bélgica: Farmacêuticos realizam ajustes em terapias crônicas e prescrevem medicamentos para condições menores, com forte integração aos sistemas nacionais de saúde.
Conclusão
A atuação clínica dos farmacêuticos no Brasil, ancorada na Resolução CFF 586/2013, é uma resposta essencial às necessidades de saúde da população, ampliando o acesso, promovendo o uso racional de medicamentos e fortalecendo o cuidado preventivo. Dados como o crescimento de 500% nas prescrições farmacêuticas em 2023 e a realização de mais de 7,3 milhões de atendimentos apenas no primeiro semestre de 2024 evidenciam o impacto positivo dessa prática.
Lamentamos que uma entidade de profissionais de saúde priorize PROIBIR e COIBIR a atuação de outros profissionais de forma corporativista, colocando barreiras à colaboração e ao cuidado integrado. Quem sofre com esse retrocesso são os pacientes, que perdem acesso a um serviço de saúde mais próximo, acessível e eficaz. Não iremos retroceder — desde 2013, já foram mais de 40 tentativas de ataque judicial, pois nosso interesse está em agir em prol da saúde e da população brasileira. Já provamos o quanto podemos ajudar e iremos atuar cada vez mais, sempre que for preciso e a nação farmacêutica seja chamada, como foi durante a pandemia da COVID-19 e na epidemia da dengue.
Por fim, reafirmamos nossa missão e compromisso com a prestação de serviços de saúde de qualidade. Acreditamos no poder transformador da atenção e cuidado farmacêutico, bem como na sua capacidade de impactar positivamente a saúde e o bem-estar do povo brasileiro, em harmonia com todo o ecossistema de saúde. A farmácia possui enorme potencial para viabilizar acessibilidade à população e capilaridade aos serviços de saúde. Em um país com mais de 94 mil farmácias, mais de 8 milhões de quilômetros quadrados de extensão territorial e 220 milhões de habitantes, é inadmissível subestimar a importância estratégica do acesso e da capilaridade na saúde.
Viva a farmácia! Viva o farmacêutico! VIVA O PACIENTE e VIVA O SUS!
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