Garantir o acesso a estes medicamentos é dever do Estado, e por isso, é fundamental que haja política pública específica destinada a esses medicamentos
Os medicamentos de alto custo para tratamento de doenças raras são de extrema importância para a rede pública de saúde. Essas doenças, por serem raras, afetam um número reduzido de pessoas e muitas vezes demandam um tratamento específico e custoso.
Garantir o acesso a estes medicamentos é dever do Estado, e por isso, é fundamental que haja política pública específica destinada a esses medicamentos, com controle e fiscalização adequados para garantir a distribuição correta desses produtos e a promoção da saúde para a população em geral.
Mas o que temos visto nos últimos tempos é a falta de preparo dos gestores para que todo esse ecossistema funcione, que o medicamento chegue para quem precisa, em tempo hábil e da maneira correta. Muitas vezes o erro já começa no armazenamento, seguido por problemas de logística e transporte até que o medicamento tenha sua validade encerrada e precise ser incinerado.
Medicamentos tem uma vida útil mais curta e demandam cuidados específicos e para isso é preciso seguir as boas práticas de armazenamento. O espaço deve ter temperatura e umidade controlada, seguindo à risca, as regras dos órgãos reguladores, como a Anvisa. Precisa ser limpo, organizado e com os medicamentos separados por categoria, com registro de estoque e validade para garantir sua eficácia, além claro, de um sistema de controle de entrada e saída de medicamentos para evitar desvios e garantir que os pacientes recebam os medicamentos necessários.
Caso contrário, pacientes deixarão de ser beneficiados e continuaremos a ver muitos medicamentos serem descartados e incinerados. Outro ponto que destaco para evitar esse gargalo é usar a tecnologia a nosso favor registrando todas as informações importantes sobre o medicamento ao longo de seu trajeto, garantindo a sua segurança e eficácia, além da validade e último local de passagem.
Esse processo se tornou uma exigência legal no Brasil com a publicação da Lei nº 11.903, em 2009, que determinou a criação do Sistema Nacional de Controle de Medicamentos (SNCM), que é um sistema integrado que permite a rastreabilidade de medicamentos em todo o país e tem como objetivo prevenir a falsificação, o desvio e o contrabando de medicamentos e que trará benefícios significativos para a saúde pública e para os pacientes.
Porém, a implantação do SNCM no Brasil já deveria ter sido concluída, contudo, o Senado aprovou a sua prorrogação até 2025 e até o momento estão sendo incluídos nesse sistema os medicamentos de uso humano que contêm substâncias sujeitas a controle especial, como os medicamentos controlados, os anabolizantes e os psicotrópicos. Mas, quando implementada de maneira integral, será um passo importante para o segmento.
Destaco também que a rastreabilidade é capaz de identificar quais os medicamentos mais utilizados e os que apresentam maiores índices de desperdício ou desvios. Isso permitirá que os gestores e as autoridades possam tomar medidas para reduzir o desperdício e direcionar os recursos de forma mais eficiente. Unindo a rastreabilidade com sistemas estatísticos e de inteligência será um passo importante para evitar a compra de produtos sem que haja demanda e com isso, o descarte de medicamentos será cada vez menos comum.
Mas, enquanto isso não acontece e os medicamentos vão se aproximando da validade, uma das formas de evitar que grandes quantidades de remédios sejam incineradas é por meio da doação desses remédios. Existem instituições e programas que recebem doações de medicamentos não utilizados e ainda dentro do prazo de validade, para distribuí-los à população carente. Para isso, também é preciso que haja controle e no mínimo, esforço humano para acompanhar, catalogar e distribuir esses insumos.
Mas, se chegarmos ao ponto de deixar os medicamentos vencerem, é preciso realizar o descarte correto desses medicamentos, seguindo as orientações dos órgãos de saúde, para que sejam eliminados de forma segura e controlada, sem prejudicar o meio ambiente.
Por fim, só podemos torcer para que o Estado invista em tecnologia e possa se contar com os benefícios da rastreabilidade, sistemas estatísticos e de inteligência para contribuir não apenas para o desenvolvimento de novas terapias e tratamentos, mas também para evitar desperdício de saúde e de dinheiro.
Artigo de Jackson Campos é Diretor de Relações Institucionais da AGL.
Fonte: https://medicinasa.com.br/estado-queima-medicamentos/